4.3
AS TARIFAS

Os efeitos negativos das importações ou práticas "abusivas" de dumping reclamam acções "defensivas" ou "correctivas" por parte dos Governos, surgindo então a aplicação das tarifas, consideradas sempre pelos defensores mais extremados do liberalismo como uma prática prejudicial.

Tarifa é um imposto lançado sobre um bem ou serviço importado. Pode ser específica, quando o valor do imposto por unidade é fixo, ou ad valorem, quando o imposto é uma dada fracção do valor do bem ou serviço importado.

O efeito imediato da tarifa é a subida de preço do bem ou do serviço, de tal modo que os consumidores domésticos pagam um preço superior ao preço internacional, tal como se representa na figura 4.3.

FIG. 4.3  Efeitos de uma Tarifa.

Quais são então os efeitos da aplicação de uma tarifa?
A figura 4.3 mostra que a quantidade consumida no mercado passa a ser qf em lugar de qe (deixa-se de importar a quantidade qe - qf) e o preço sobe de pi para pt, o que permite que os produtores locais subam a sua produção para qs, substituindo as importações qs - qr.
Globalmente, há um aumento da produção interna, uma diminuição da quantidade consumida e uma diminuição das importações que passam a ser apenas de qf - qs (em lugar de qe - qr). , assim, alguma protecção aos produtores locais e um prejuízo relativo para os consumidores, entendendo-se a utilização da política tarifária como um instrumento de
protecção de indústrias nascentes.
Contudo, os efeitos totais são bem mais profundos que estes, envolvendo "transferências" que não podem deixar de ser relevadas. Assim, comparativamente à situação de comércio livre, a produção doméstica de qs - qr equivale, no contexto do modelo simples que nos continua a servir de referência, a um perda de bem-estar representada pela área I, na medida em que o custo interno de produção é I + II e apenas se poupa II, devido à não drenagem de divisas por ausência de importação.
Do mesmo modo, a diminuição de importações de qe - qf leva a uma diminuição de bem-estar equivalente à área IX, já que a poupança de divisas, representada pela área X, não compensa a perda de utilidade dos consumidores.
No entanto, subsiste um problema de interpretação relativamente às áreas IV e VII. Não há dúvida de que elas correspondem a perdas de excedente dos consumidores, pois têm de pagar as importações ao preço pt em lugar de despenderem apenas pi. Contudo, esse excedente é capturado pelo Estado que, se for assumido como representante da sociedade, garante não ter havido perda de bem-estar, mas apenas transferência de parte dele.
De tudo isto resulta um aumento de produção interna de qs - qr, que justifica a defesa da política tarifária na protecção de indústrias nascentes, ao permitir um maior uso de recursos internos com algum prejuízo dos consumidores e uma perda global de bem-estar (as áreas I+IX) - o grande argumento dos liberais mais radicais contra toda e qualquer tarifa - e ainda uma transferência dos consumidores em favor do Estado. Facilmente se entende que um julgamento global de todas estas alterações não é fácil nem unívoco.

Relativamente ao nível de protecção fornecido por uma tarifa, há que ser muito cauteloso, como bem lembram Krugman e Obstfeld, fundamentalmente por duas razões: 

  • dimensão do país importador;
  • tipo de produto sobre o qual incide a protecção tarifária.

No que toca ao primeiro problema, é claro que se o volume de importações de um país é muito elevado relativamente à dimensão do mercado mundial, o lançamento de uma tarifa sobre essas importações poderá perturbar o preço internacional existente, levando ao abaixamento do preço da exportação e não tanto a uma subida de preço no mercado importador.
O segundo problema conduz-nos ao conceito de protecção efectiva que distingue o efeito que as tarifas exercem nos vários estádios de produção.
A título de exemplo, consideremos que o preço de um dado televisor no mercado mundial é de 50 000$00 e que o valor das suas componentes, antes da sua montagem, é de 40 000$00. Admitamos que um dado país está interessado na protecção da sua indústria de montagem de televisores, impondo para isso uma tarifa de 20% sobre o valor dos televisores, isto é, estes serão vendidos no mercado doméstico a 60 000$00. Para ser competitiva no mercado doméstico, a montagem pode então custar 20 000$00, em lugar de 10 000$00 na ausência de qualquer tarifa. Isto significa que uma tarifa de 20% sobre o televisor se transformou numa protecção efectiva de 100% à indústria doméstica de montagem. Facilmente se demonstra que uma tarifa imposta ao produto de um estádio intermédio pode, inclusivamente, acarretar uma protecção efectiva negativa à protecção do estádio subsequente, designadamente se o produto final não estiver sujeito a qualquer tarifa protectora. O que efectivamente está em jogo na protecção é o Valor Acrescentado nas empresas nacionais, e daí que a taxa de protecção efectiva para um sector seja definida pela razão (Vt - Vw)/ Vw, sendo Vw o Valor Acrescentado no sector a preços internacionais e Vt o Valor Acrescentado na presença das tarifas.

 

© Sociedade Portuguesa de Inovação, 1999
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