Esta definição de Husted e Melvin tem evidentemente implícita a compartimentação dos países como mercados geográficos separados, ainda longe das ideias de globalização ou de mundialização já discutidas no Capítulo 2, que impõem a designação de transnacionais desde que as empresas não estejam peadas nas suas estratégias por posições diferenciadas dos vários países.
De um modo ou de outro, há que reconhecer que as multinacionais e transnacionais são as grandes responsáveis por boa parte do
IDE e pela mobilidade dos factores no mercado mundial.
Mas quais as razões para a existência e sucesso deste tipo de empresas? Sem querer fazer uma extensa teoria sobre o assunto, há que reconhecer que as duas vertentes que têm de subjazer à busca da resposta a esta pergunta são a teoria de localização e os
custos de transacção em sentido lato, ligados ao problema da endogeneização ("internalização") de certas
actividades.
A primeira incide na escolha do local que apresenta as condições óptimas de produção, tendo em atenção a disponibilidade local de factores, a facilidade de mobilidade de factores exteriores para esse local, as condições ambientais e institucionais e a localização dos clientes, entre outras. É no fundo a aplicação da teoria "clássica" da localização, apenas agora mais "aberta" pelas condições oferecidas pela mundialização da
economia que, entre outras coisas, aumenta e acelera a mobilidade de factores permitindo colocar num dado local factores primários ou produtos intermédios provindos de grandes distâncias.
Ao contrário, a invocação da segunda vertente pode ser mais perturbadora. Porque é que a produção se dá em mais do que uma unidade? E porque é que existe um domínio comum dessas unidades espalhadas por vários
locais do mundo?
A primeira pergunta está, de algum modo, em contradição com a observação de "localização concentrada" feita atrás a propósito da teoria da localização, e tem uma resposta fácil na perspectiva "internacional", que em muitos casos é alterada quando se passa à perspectiva de mercado mundializado. Assim, existem situações onde o esgotamento das
economias de dimensão e a satisfação de peculiaridades de mercados
locais e regionais mantêm o nível de descentralização da produção, mesmo em condições de integral mobilidade no mercado mundial. Contudo, outras localizações existem, escolhidas por respeito a limites nacionais estabelecidos (o caso de algumas empresas sujeitas a RVE em alguns países decidirem estabelecer neles unidades produtivas para contornar essas restrições e satisfazer um mercado atractivo é um bom exemplo destas condicionantes), que deixam de fazer sentido e serão encerradas, com concentração de produção noutras localizações existentes ou mesmo criação de uma nova localização à custa das existentes, para aproveitamento de economias de dimensão ou de outras vantagens estratégicas até aí não capturáveis devido às condições que restringiam a mobilidade dos factores.
Esta reconfiguração das condições de produção proporcionada pela mundialização, particularmente activa nas zonas económicas integradas onde o "atrito" à mobilidade de factores é mais diminuto, vai de par com a tentativa de resposta à segunda pergunta que reflecte a concentração do poder económico. A causa é só uma: a enorme mobilidade do
capital, proporcionada pelas novas tecnologias de informação, associada à capacidade de criação e de manutenção de imagens de marca a nível mundial que exigem a aplicação de montantes enormes, bem como os esforços de investigação e de inovação que estão na base da liderança mundial. A estas características estratégicas associa-se a possibilidade de diminuir
custos de transacção que são inerentes às negociações em grande escala que só a disponibilidade de elevados montantes de capital proporciona.
É claro que este é assunto controverso e constitui afinal o âmago da discussão sobre a mundialização, fora das potencialidades deste manual, até porque não é ainda questão "fechada". O que importa aqui relevar é que todas estas alterações na configuração mundial das relações económicas têm como centro a acrescida mobilidade de factores que passam para fora das suas fronteiras, em contraste com os modelos clássicos de comércio internacional onde os bens e serviços eram trocados, mas os factores considerados como fixados num dado espaço económico.
Era essa fixidez que dava sentido a algumas políticas nacionais baseadas na tentativa de melhorar a eficiência desses factores bem como a sua remuneração. A perda do "direito de jurisdição" sobre esses factores implica a busca de novos contornos para as políticas nacionais.
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