1.6
O PIB per capita e a PARIDADE do PODER de COMPRA (P.P.C.)

O PIB per capita tem sido o indicador mais usado internacionalmente para "medir" o desenvolvimento de um país e é frequente verem-se os países comparados e ordenados por este indicador que, obviamente, resulta da divisão do PIB de um país pelo seu número de habitantes. É um indicador da intensidade média de geração de valor, durante um ano, por cada habitante, ultrapassando-se assim o factor "quantidade" implícito na dimensão humana do país. 
Deste modo, por este critério, as designadas maiores economias do mundo não têm que ser necessariamente as mais ricas ou desenvolvidas, em particular se a grande dimensão da economia provier do elevado número de habitantes. Assim, a Federação Russa é, obviamente, uma economia maior (345 mil milhões de dólares de PIB, em 1995, segundo o Relatório do Desenvolvimento Humano 1998" do PNUD) que a da Dinamarca (172 mil milhões de dólares), conquanto esta seja mais "rica" (29890 dólares per capita) que aquela (2240 dólares per capita).
 

Uma anedota corrente nos países de economia de direcção central, antes da queda do Muro de Berlim, que adaptamos livremente de C. Banc and A. Dundes (1990), ilustra bem os equívocos que se geram com este conceito.
Discutiam vários amigos sobre qual o melhor emprego, emergindo naturalmente os postos mais apetecidos da Numenklatura, quando uma das pessoas concluiu:
Mas o melhor de tudo mesmo é ser um capita. Tem-se direito a uma enormidade de toneladas de aço, de energia eléctrica, de quilómetros de estrada, etc., etc.


Deixando de lado, para já, as críticas que este indicador justifica como medida de riqueza, convém, no entanto, fazer ressaltar o papel que os preços relativos e o uso de uma moeda de base têm nestas comparações, podendo distorcer o valor aquisitivo das disponibilidades geradas. A consciência desta potencial perversão conduziu a um outro conceito de
PIB per capita ligado à capacidade aquisitiva, que é medido pelo que se designa por paridade de poder de compra (PIB per capita p.p.c.). Essa "medida" é estabelecida com base na relação entre o preço de um dado "cabaz de compras" num país e o preço desse mesmo cabaz nos EUA, sendo essa "taxa de câmbio implícita" usada em lugar da taxa de câmbio oficial relativamente ao dólar com que se calculam os tradicionais PIB per capita.
Se os preços relativos no país em causa e nos EUA forem os mesmos, os dois PIB per capita assumem exactamente o mesmo valor. Mas se os preços forem mais baixos nesse país que nos EUA, o PIB per capita (p.p.c.) terá um valor superior ao PIB per capita expresso em dólares, traduzindo, afinal a uma maior capacidade aquisitiva da moeda local do que a sugerida pela taxa de câmbio oficial. Obviamente, o contrário sucede quando os preços relativos do cabaz forem menores nos EUA. 
O que se verifica na realidade com o uso da paridade do poder de compra é uma alteração substancial das posições relativas estabelecidas com os valores obtidos com as taxas de câmbio oficiais. Assim, utilizando paridades de poder de compra, o PIB per capita da Federação Russa (4531 dólares em 1995) aproxima-se bastante mais do da Dinamarca (21938 dólares), passando de uma relação de cerca de 1/13,3 implícita no uso da taxa de câmbio oficial para 1/4,9.
A alteração para Portugal é, também, particularmente significativa. Utilizando as informações do nº 212 de L'Observateur de l'OCDE, de 1998, o PIB per capita estimado à taxa de câmbio oficial foi, para 1996, de 10425 dólares, enquanto a utilização da paridade de poder de compra conduziu a um valor de 13100 dólares, isto é, um valor mais elevado em cerca de 25,7%(!).
Interessante é a alteração relativa face aos valores apresentados para Espanha. Para este país esses valores são, respectivamente, 14894 e 14954 dólares, o que significa que, de acordo com estas estimativas, enquanto o PIB per capita é apenas cerca de 70% do espanhol se calculados às taxas de câmbio oficiais, essa percentagem sobe claramente para 87,7% se os cálculos forem efectuados na lógica da paridade do poder de compra, revelando-se, deste modo, a precaridade e o relativismo destas comparações. 
De facto, não pretendemos com estes exemplos evidenciar a superioridade absoluta de qualquer das duas aproximações ao PIB per capita, tanto mais que reconhecemos que a paridade de poder de compra tem também deficiências graves, como é o caso das diferentes estruturas de despesas dos países que não podem ser capturadas pela uniformidade que se pretende impor a um cabaz. Além do mais, essa uniformidade é falaciosa porque omite as diferenças de qualidade dos produtos nele incluídos, capazes de justificar, só por si, as diferenças de preços relativos.
O que pretendemos mostrar é a necessidade de ter muita cautela na estimação destes valores e no uso que deles fazemos, designadamente quando pretendemos comparar diferentes economias.

 

© Sociedade Portuguesa de Inovação, 1999
Edição e Produção Editorial: Principia.    Execução Técnica: Cast, Lda.