Ao escrevermos o último capítulo deste pequeno manual, designadamente quando formulámos as últimas questões para discussão,
ficou-nos a desagradável sensação de poder ter escrito a mais sobre alguns temas, com manifesto prejuízo de outros, ao mesmo tempo que sentíamos
faltar-nos espaço e tempo para nos debruçarmos sobre os assuntos mais candentes dos novos desafios que se abrem ao gestor internacional no campo da escolha da localização óptima das unidades, na organização e governação das empresas e no uso da Internet na busca de novas configurações.
Cremos, no entanto, poder confirmar a nossa intuição de que a "novidade" da gestão internacional continua a residir na problemática de conseguir o encontro cultural e na adequada gestão das pessoas em consonância com as suas aptidões actuais e as suas capacidades de as melhorar no futuro, sem esquecer o posicionamento ético que, manifestamente, não pode ser "atirado para debaixo do tapete".
A intensificação da globalização, incluindo a sedimentação da economia digital e a ubiquidade crescente da Internet, não põem em causa, antes agravam, a necessidade e a urgência de aprofundar as questões éticas e culturais,
dando-lhes novos contornos e reconfigurando o problema da comunicação e da liderança.
Mas outra conclusão é para nós evidente: não há unanimidade sobre a influência da globalização nos diversos campos da gestão, com ênfase na natureza da liderança. Sobrevêm amplos campos de debate como, por exemplo, a identificação da liderança nas equipas, que são cada vez mais "conjunto de iguais".
Ligado a esse problema de liderança, ou ausência dela, está o assunto da autoridade e do seu entendimento, sendo legítimo
perguntarmo-nos, como faz R. Sennet, se o trabalho em equipa, de constituição fugaz, não é mesmo um processo de tentar ultrapassar o problema da autoridade e, consequentemente, da responsabilidade.
E sem responsabilidade não há referências éticas, emergindo a tentação (ou a imposição) do modelo mecanicista de desenvolvimento económico, alicerçado numa necessária evolução tecnológica pretensamente em termos de princípios.
Com globalização ou sem ela, com maior ou menor difusão e influência da Internet no futuro próximo, o gestor de um projecto internacional vai ter que fazer opções em ambiente incerto e de grande mutabilidade que mexem com a sua vida, com a vida de outros e, inexoravelmente, com os próprios ecossistemas sociais.
A questão essencial é a fidelidade a uma empresa (e o que é a empresa?) ou a fidelidade à sociedade em que se insere e até ao desenvolvimento do género humano, como um todo?
A possibilidade de o dilema se transformar em solução conjugada depende muito do modo como o conceito de empresa vai evoluir e, em particular, do modo como os accionistas definam os seus objectivos.
Mas, quer queira quer não, com maior ou menor influência de liderança individual, ao gestor do projecto caberá sempre uma marca decisiva no desenho do caminho do futuro, nem que seja indirectamente com a fuga à resposta directa ao dilema.
Por isso mesmo, terminamos com uma proposta de reflexão metodológica baseada no
Relatório de Desenvolvimento Humano 1999, no seu capítulo "Reinventar a governação global - para a humanidade e a equidade", em que são apresentados marcos que a todos desafiam:
-
É necessário reinventar a governação mundial. Ela não é uma opção, mas um imperativo para o século XXI.
-
As empresas multinacionais precisam ser abrangidas pela estrutura da governação mundial e não apenas pelo retalho de leis, regras e
regulamentações nacionais.
-
Cultura, comunidade e segurança humana estão interligadas, mas demasiadas vezes debilitadas por invasões da globalização.
-
Os extremos de desigualdade permeiam e envenenam a globalização, polarizando muitas tentativas razoáveis e desejáveis de a gerir melhor.
Todos os gestores sabem que uma das condições básicas para uma boa gestão é um perfeito entendimento do ambiente em que se inserem.
Pois bem, o ambiente é cada vez mais o Mundo, mas um Mundo que se quer diferenciado, se essa for (também e muito) a opção do gestor.
Os desafios estão postos: a escolha é sua.