1.2

O MARKETING BUSINESS-TO-BUSINESS

Uma segunda grande tendência que tem vindo a afectar de modo decisivo o marketing resulta da importância crescente do denominado business-to-business. Tradicionalmente, os manuais de marketing têm dedicado uma atenção quase exclusiva ao consumidor. Contudo, quando se sabe que uma parte muito significativa das transacções cai, não no domínio do business-to-consumer, mas no do business-to-business, novos desafios e, consequentemente, novas técnicas e ferramentas se colocam aos gestores empresariais.

A IMPORTÂNCIA DO BUSINESS-TO-BUSINESS

A par da crescente individualização do marketing, o business-to-business tem vindo a conhecer uma importância cada vez maior no mundo dos negócios, como o provam variadíssimos casos. Por exemplo, está neste momento a ser ultimado um  novo portal português de business-to-business para o sector da construção. Dessa forma, as empresas do sector poderão não só adquirir através da Internet matérias-primas, bens de equipamento ou serviços, mas também apresentar e negociar propostas e divulgar novos produtos e tecnologias.

Um outro exemplo é dado pela  Agapê – Estúdio Gráfico, uma empresa portuguesa a operar na área da publicidade e comunicação. Tendo criado a  HP_Megaprint, uma divisão digital, a empresa passou a ter uma nova forma de se relacionar com os clientes. Como afirma Rui Domingues, (citado pela  E-marketeer em 15.3.2000), director-geral da Agapê, “o www.megaprint.pt, faz parte da nossa estratégia no mundo do business-to-business indo assim ao encontro das necessidades dos nossos mega clientes”.

 

APLICAÇÃO:PARCERIA ENTRE A PARAREDE   E A AEP, PARA EXPLORAÇÃO
DO BUSINESS-TO-BUSINESS

A ParaRede e a AEP – Associação Empresarial de Portugal firmaram um acordo de parceria que vai resultar na constituição de uma empresa conjunta para a exploração do “e-business center” (centro de negócios electrónico) em Portugal. A ParaRede será maioritária neste projecto, que será integrado no “e-business center” a nível mundial que está a ser implementado pela ParaRede, Sterling Commerce e Satyam. O centro de negócios electrónico será constituído por portais sectoriais, em que cada empresa poderá ir buscar informação sobre a sua actividade, mas também fazer negócios com fornecedores e clientes (comércio electrónico intra-empresas –  “business to business” ou B2B).

 

Fonte:Diário Económico, 22.3.2000.  

Por outro lado, as previsões da Forrester Research , um dos maiores especialistas em comércio electrónico, apontam para um crescimento quase imparável do business-to-business, não só a nível mundial mas também no nosso País (figura 1.3).

A Forrester Research não representa, aliás, uma voz isolada. Quase todas as empresas a operar nesta área prevêem um forte crescimento do business-to-business, especialmente quando comparado com o business-to-consumer.

 

Figura 1.3 – Evolução do Comércio Electrónico Business-to-Business

APLICAÇÃO: B2B – A SEGUNDA REVOLUÇÃO

 

O B2B começa a ser encarado pelos analistas como o "segundo advento da Internet", sendo que o primeiro terá sido a própria World Wide Web. Esta é pelo menos uma das conclusões que se pode tirar de um estudo recente sobre o sector do Business-to-Business ( B2B) na Net, elaborado e divulgado pela  AdRelevance, uma empresa especializada em audiometria.

De acordo com o estudo da AdRelevance, nos últimos quatro meses assistiu-se a um crescimento generalizado no que toca a esta actividade. A começar pela publicidade feita pelas empresas, que aumentou em cerca de 59 por cento, face a período homólogo anterior, para acabar pelos próprios contactos por empresa, que registaram um aumento de 66 por cento nestes mesmos quatro meses.

 

Fig. 1.4 – Evolução relativa do B2B. (Fonte: AdRelevance)

 Fonte:Casa dos Bits, 29.3.2000

Por tudo isto, torna-se imperioso conhecer melhor o que é o marketing business-to-business.

Em traços gerais, ele distingue-se do marketing de consumo essencialmente a três níveis:

 

  • comportamento do comprador;

  • segmentação do mercado;

  • gestão das variáveis do marketing-mix.

O COMPORTAMENTO DO COMPRADOR

Qualquer organização é constituída por pessoas com diferentes interesses e experiências, pelo que se torna necessário conhecer as suas percepções e motivações. Em última instância, são os indivíduos que tomam as decisões, e, como tal, as transacções implicam relações entre as pessoas que constituem as organizações.

A Relação de Compra

As decisões de compra ao longo dos canais de distribuição têm por base considerações económicas que envolvem questões como a procura potencial, os níveis de inventário, a rentabilidade do produto, a disponibilidade de espaço nos expositores, etc. As exigências dos clientes industriais são, por regra, muito específicas, técnicas e altamente complexas. Por outro lado, a rentabilidade da organização que efectua a compra depende dos produtos adquiridos, da forma como são adquiridos, do momento em que o são, bem como das garantias que lhes estão associadas. Por tudo isto, o comportamento do comprador organizacional tende a ser profissional e relativamente formal.

Convém desde já esclarecer que os clientes organizacionais englobam entidades muito diversificadas, podendo ser agrupados em três grandes classes:

  • organizações privadas com fins lucrativos;

  • organizações da administração central ou local;

  • organizações sem fins lucrativos.

 

Para desenvolverem a sua actividade, os clientes organizacionais têm de interagir com outros agentes, assistindo-se com frequência ao estabelecimento de relações estáveis e duradouras com os fornecedores. Deste modo, as transacções efectuadas não tendem a ser episódios isolados mas elementos que ajudam a construir uma relação entre comprador e vendedor.

O CENTRO DE COMPRAS

As pessoas envolvidas nas transacções inter-organizacionais desempenham diferentes papéis e têm diferentes recursos à sua disposição para a tomada de decisões. Este conjunto de pessoas denomina-se centro de compras.

A sua composição varia de empresa para empresa e de compra para compra. Um centro de compras genérico é constituído pelos elementos representados na figura 1.5.

Fig.1.5 – Composição de um Centro de Compras.

Iniciador 
O processo de compra organizacional inicia-se com o reconhecimento de uma necessidade. Esta observação é feita pelo iniciador do centro de compras. Este elemento poderá pertencer ou não à organização na medida em que estas estão normalmente sensibilizadas para as opiniões de entidades exteriores que se poderão revelar cruciais para o seu normal desenvolvimento. Por exemplo, os fornecedores, ou até mesmo os clientes, poderão actuar como iniciadores no caso de deterem conhecimentos tecnológicos que permitam identificar determinadas necessidades da empresa vendedora que não são detectadas ao nível interno.

Influenciador
Existem determinadas empresas – ditas de referência – que exercem, voluntária ou involuntariamente, uma forte influência sobre as outras, condicionando, designadamente, as suas opções em termos de compras. Cabe aos marketers industriais reconhecer essas empresas, actuando sobre elas com fortes campanhas de comunicação que direccionem as suas opções de compra. Estas empresas de referência são denominadas influenciadores externos. Existem também influenciadores internos tais como, por exemplo, os responsáveis pelo controlo da qualidade. Por vezes, o seu peso é tão forte que os decisores desempenham apenas uma função burocrática.

Filtro
Os filtros são os elementos que regulam o fluir de informação para os diferentes elementos do centro de compras. Sem informação não é possível a tomada de qualquer decisão. Neste contexto, os filtros desempenham um papel crucial no processo de compra, devendo os fornecedores prestar-lhes uma especial atenção. As secretárias de direcção desempenham muitas vezes o papel de filtro.

Decisor
Como a palavra indica, são aqueles que efectivamente têm a última palavra no processo de compra. Em geral, ocupam lugares elevados dentro da estrutura hierárquica das empresas, excepto no caso das compras de rotina e baixo valor. Por vezes, o comprador é, na realidade, um conjunto de pessoas, como por exemplo a gerência ou o conselho de administração. Mas, mesmo nestes casos, é usual haver um elemento que, em última instância, tem o pelouro dos aprovisionamentos e, consequentemente, exerce o papel de decisor.

Comprador
Os compradores desempenham diferentes funções, de acordo com a complexidade da compra. Caso se trate de uma compra rotineira e sem grandes especificações, o comprador é, por vezes, o único elemento do centro de compras, cabendo-lhe a tarefa de escolher o fornecedor e de estabelecer os termos do contrato. Caso se trate de uma compra importante para a organização, ao comprador caberá apresentar aos restantes elementos do centro de compras as diferentes opções de fornecimento. Um director financeiro é um caso típico de comprador organizacional.

Utilizador
Não são raros os casos em que o utilizador tem um papel reduzido no processo de compra organizacional. Um operário que labora directamente com uma máquina é um exemplo de um possível utilizador. Contudo, não se pode deixar de reconhecer que muitas vezes os utilizadores são o elemento do centro de compras com mais condições para especificar as características do produto ou serviço a adquirir, podendo mesmo chegar a desempenhar o papel de decisor ao contribuírem para a escolha de determinado fornecedor.

Em suma, as organizações têm à sua disposição uma série de recursos, nomeadamente informação e conhecimento técnico, que lhes permitem a tomada de decisões. Aquelas que prestam uma maior atenção à pesquisa de compras são, tendencialmente, mais independentes dos fornecedores no que toca à obtenção de informação e têm mais facilidade na avaliação de opções de compra.

 

Factores que influenciam a decisão do comprador

O processo de compra e as decisões que lhe são inerentes têm subjacentes toda uma série de factores relacionados com a própria entidade compradora ou com as que com que ela se relacionam. A figura 1.6 resume os diferentes factores que afectam as decisões de compra organizacional.

 

Fig. 1.6 – Factores que afectam as decisões de compra organizacional.

Factores Ambientais 
Englobam uma série de aspectos relativos aos contextos físico, económico, tecnológico, legal, político e cultural.

Factores Organizacionais
Incluem-se nesta classe todos os factores ligados à própria organização, designadamente a tecnologia, a política de compras, a estrutura organizacional da empresa e as próprias pessoas envolvidas.

Factores Relativos ao Centro de Compras
O fornecedor tem que ter plena consciência dos recursos disponíveis e dos papéis desempenhados pelos diferentes elementos do centro de compras, devendo abordar cada elemento de acordo com a sua função e importância.

Factores Individuais
Por último, há que salientar que, em última instância, não é a organização em si que procede às compras, mas sim os indivíduos que a compõem. Como tal, as suas motivações e necessidades têm que ser devidamente compreendidas, na medida em que podem afectar fortemente o processo de compra. Factores como o modo de negociar do comprador e a sua ética são aspectos a não desprezar.

 

SEGMENTAÇÃO DE MERCADOS ORGANIZACIONAIS 

Muito poucas são as empresas com capacidade para actuarem com sucesso em todo o mercado. Normalmente direccionam os seus esforços para determinados segmentos.

 


 

Um segmento de mercado é uma parte do mercado constituída por um conjunto de clientes (actuais ou potenciais) com características relativamente homogéneas.

O desenvolvimento de uma estratégia de segmentação envolve essencialmente duas fases:

  • segmentação propriamente dita;

  • escolha dos segmentos-alvo.

 

Segmentação Propriamente Dita

Segmentar um mercado significa, em primeiro lugar, dividi-lo em grupos de clientes com características relativamente homogéneas. Para isso, é necessário identificar critérios de segmentação. Existindo, a priori, múltiplos critérios possíveis, tem sido prática a sua sistematização em diversas categorias. Uma das classificações mais difundidas para mercados de consumo baseia-se em quatro grandes critérios:

  • geográficos (país/região, dimensão do agregado populacional, clima,...);

  • demográficos (sexo, idade, nível de rendimento do agregado familiar,...);

  • psicográficos (estilo de vida, personalidade,...);

  • de comportamento face ao produto (hábitos de utilização, grau de fidelização, benefícios procurados,...).

No domínio do business-to-business, dada a especificidade quer dos produtos quer dos actores envolvidos, é usual entrar em linha de conta com aspectos relativos ao processo de compra e à própria estratégia das empresas. Assim, para além dos geográficos, é vulgar a utilização de critérios sectoriais, organizacionais (dimensão da empresa, tecnologia usada,...), estratégicos (estratégia competitiva adoptada,...), relativos ao processo de compra (dimensão das encomendas, nível de centralização/descentralização da decisão de compra,...), etc.

 

NÍVEL DE DESENVOLVIMENTO

BENEFÍCIOS DA SEGMENTAÇÃO

 A segmentação dos mercados tem uma importância crucial, pois:

  • possibilita uma análise de oportunidades mais eficaz;

  • é a base de todo o processo de targeting (i.e., selecção dos segmentos-alvo);

  • permite o desenvolvimento de um posicionamento competitivo.

 

Fig. 1.7 - Vantagens da segmentação dos mercados.

No âmbito do business-to-business deve-se proceder a um processo de segmentação multi-passo que consiste no recurso, em primeiro lugar, a variáveis mais objectivas e, se necessário, já numa segunda fase, a variáveis de cariz mais subjectivo.

Com efeito, a compra organizacional, envolvendo um conjunto de actores que interagem numa unidade de decisão é, por regra, muito mais complexa do que a compra de um bem de consumo. Por essa razão, o próprio processo de segmentação tende também a ser mais complexo e sofisticado.

As bases utilizadas para a segmentação de mercados business-to-business podem ser muito variadas. É usual a sua decomposição em três níveis (figura 1.8).

 

 

Fig. 1.8 - Abordagem multi-passos da segmentação de mercados business-to-business.

Macro-segmentação
Pela macro-segmentação obtém-se os denominados segmentos de mercado tradicionais e não-comportamentais, definidos pelo tipo de organização, tamanho, etc. As bases apontadas podem, por vezes, ser suficientes para explicar o comportamento das empresas. Neste caso, não é necessário passar à análise de outras bases, nomeadamente das intermédias. A macro-segmentação é efectuada com variáveis denominadas de emporográficas (emporium significa local de comércio).

Segmentação Intermédia
Para se proceder à segmentação intermédia recorre-se a três grupos de variáveis:

  • Operacionais, tais como a tecnologia utilizada e as competências dos clientes.

  • Abordagens de Compra, que incluem essencialmente os aspectos relativos ao processo de compra.

  • Factores Situacionais, tais como a dimensão das encomendas e suas características.

Micro-segmentação
Ao nível da micro-segmentação analisam-se os grupos e indivíduos do centro de compras, o seu estilo de tomada de decisão, a sua sofisticação técnica e a sua atitude face ao risco. A obtenção de dados é mais complexa, uma vez que se trata de variáveis comportamentais. A força de vendas desempenha aqui um papel fundamental para a recolha deste tipo de informação.

Fig. 1.9 - Processo sequencial de segmentação dos mercados organizacionais.

Em suma, a segmentação de mercados business-to-business é geralmente mais complexa do que no caso dos mercados de consumo. Neste sentido, as empresas devem proceder a uma abordagem sequencial (figura 1.9), começando pelas variáveis não-comportamentais, utilizando critérios mais subjectivos apenas e quando a sua utilidade for manifesta.

 

Escolha dos Segmentos-Alvo

Uma vez segmentado o mercado, a empresa deverá seleccionar o ou os segmentos em que pretende actuar. Dependendo de uma multiplicidade de factores, deve-se, no entanto, realçar dois que, pela sua relevância, assumem um papel crucial nesta fase: as aptidões e recursos da empresa e as características dos vários segmentos. Concretamente, recomenda-se que cada empresa se tente posicionar em segmentos que sejam simultaneamente atractivos e para os quais possua vantagens competitivas.

Acrescente-se ainda que, caso se trate de uma pequena unidade económica, é importante tomar igualmente em consideração o posicionamento das unidades de maior dimensão – isto é, onde estão e como actuam. Isto não quer dizer que as empresas de menor dimensão tenham necessariamente que “fugir” das maiores. Contudo, parece razoável evitar o confronto directo apostando, nomeadamente, em nichos de mercado que, pelas suas próprias características, não sejam tão atractivos para as grandes empresas.

Segmentado o mercado e seleccionados os segmentos onde pretende actuar, a empresa deve então estabelecer o modo como aí irá operar. Por outras palavras, há que definir um conceito de posicionamento assente num conjunto de características relevantes que permitam que a sua oferta ocupe uma posição distintiva junto do público que se pretende atingir. É, portanto, a partir daqui que faz sentido falar do marketing-mix, ou seja, do conjunto de ferramentas de marketing que cada empresa dispõe para prosseguir os seus objectivos dentro de cada um dos segmentos-alvo. Existindo dezenas de elementos que poderão fazer parte do marketing-mix, a sistematização mais difundida deve-se a Jerome McCarthy que, em 1975, popularizou os “4 Ps”: Produto, Preço, Promoção e Distribuição (“Place” em inglês).

 

A gestão do marketing-mix

Gerir estas variáveis no âmbito do business-to-business tem especificidades que as distinguem do business-to-consumer. Segue-se, de uma forma breve e esquemática, uma apresentação das principais diferenças (figura 1.10).

, no entanto, que realçar uma diferença fundamental entre o marketing business-to-business e o marketing business-to-consumer: o processo de interacção. Na realidade, mais importante do que as diferenças ao nível das principais variáveis do marketing-mix, é o carácter relacional do business-to-business, carácter esse que, como se referiu na secção 1.1, se tem vindo a alargar ao marketing de consumo.

Fig. 1.10 - A especifidade do Marketing business-to-business.

 
© Sociedade Portuguesa de Inovação, 1999
Edição e Produção Editorial: Principia.    Execução Técnica: Cast, Lda.