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DISCUSSÃO DO CONCEITO DE "INTERNACIONALIZAÇÃO"

Este termo tem sido privilegiadamente utilizado para identificar estratégias empresariais, e em Portugal, na última década, têm abundado programas de apoio à “internacionalização” de empresas portuguesas. Cremos, assim, valer a pena partir da intuição ligada a esse processo, para melhor entendermos o conceito de “internacionalização” ligado a um país, afinal aquele que deu sentido e conteúdo à disciplina de “Economia Internacional”.
Como é óbvio, apesar de as relações económicas internacionais de um país não se circunscreverem aos movimentos empresariais, a internacionalização da actividade económica de um país está profundamente imbricada com a das empresas, em sincréticas relações de causa-efeito que é importante tentar identificar. Assim, o conceito mais comum de internacionalização apresenta uma característica unidimensional, assumindo-se como um movimento estratégico de dentro para fora que pode revestir níveis diferentes, desde a simples exportação até à criação de estabelecimentos produtivos no estrangeiro.
Ora esta visão de “internacionalização” é demasiado restritiva, colidindo, inclusivamente, com a ideia de internacionalização de um país em sentido global, já que ignora os movimentos activos de empresas estrangeiras, mesmo que só no campo primário das importações. Estes movimentos, há muito existentes em Portugal, mas particularmente relevantes desde a nossa adesão à EFTA, intensificados com a entrada na CEE e modificados qualitativamente pelo Acto Único Europeu   (passando da exportação à crescente entrada de factores, consubstanciada fundamentalmente no Investimento Estrangeiro), são um sinal claro de internacionalização “sofrida” pela economia portuguesa sem intervenção das políticas activas de empresas nacionais.

Próximo conceito

No limite, pode-se dizer que uma empresa, que não estava habituada a defrontar a concorrência estrangeira no seu próprio mercado, sofre um primeiro impacte de internacionalização exactamente em consequência da internacionalização da economia do país em que está localizada. E mais! Começando por sofrê-la ao nível primário dos produtos importados, vê-se, pelo aprofundamento do processo de integração português, confrontada com uma inesperada concorrência em todos os mercados em que opera a montante e a jusante, isto é, não só nos mercados dos seus produtos, mas também no mercado dos factores (mão-de-obra, matérias-primas, entre outros) e até no mercado institucional, sofrendo a imposição de novas regras, também elas importadas.

Então, a focalização na internacionalização de fora para dentro pode obnubilar este fenómeno inelutável de internacionalização passiva que, apresentando uma expressão bem maior, é preponderante na caracterização das relações económicas internacionais e, consequentemente, na colocação do país na cena mundial.
Se estas relações de duplo sentido ajudam a descrever a “internacionalização”, a verdade é que o conceito continua muito difuso, sendo imprescindível encontrar a sua característica distintiva. E essa só pode ser encontrada na essência do termo subjacente ao conceito. Desta forma, entendemos que

Próximo conceito

Internacionalização de uma economia  é o conjunto de todas as relações, que afectam a esfera económica, estabelecidas entre uma nação e todas as outras. Esta definição implica a separabilidade dos mercados geográficos nacionais.

Neste sentido, a internacionalização pressupõe a manutenção de alguma reserva de domínio específico de uma nação, de forma que ela, por sua iniciativa, o possa trocar, vender, disponibilizar, ou não, face a outras nações.
Procurando colocar a economia portuguesa neste contexto, somos de opinião que, em termos estritos, já se não pode falar da sua internacionalização, estando essa fase ultrapassada pela cedência do tal direito de reserva. De facto, a criação do Mercado Único  Europeu corrompe definitivamente a “identidade” económica portuguesa, eliminando a diferença entre o mercado português e catorze outros mercados, se excluirmos a idiossincrasia dos consumidores nacionais, eles próprios, contudo, sujeitos a crescente influência (ou tentativa?) de padronização universal.
Neste contexto, o Mercado Único traduz aquilo que poderemos designar por pós-internacionalização definitiva e irreversível da economia (e das empresas) portuguesas, confundindo inclusivamente estratégias activas de internacionalização “clássica” (desde que para países da União Europeia) com internacionalização “passiva”: é que, no novo contexto, todos estes movimentos são endógenos ou internos à União. É por isso que os conceitos de Exportação e Importação dentro da União Europeia já não fazem sentido, porque são trocas no Mercado Interno.
Mas, se dúvidas houvesse sobre esta alteração radical, a União Económica e Monetária (UEM ) e o Euro aí estão para dar mais força a este plasmar da economia portuguesa num espaço alargado que elimina a sua identidade. Agora a moeda nacional varia apenas (e varia através do Euro, é bom não esquecer) face a espaços económicos exteriores à UEM, que, assim, passa a ser a entidade relativamente à qual ainda é legítimo falar de internacionalização em termos clássicos (em boa verdade, há que discutir se essa legitimidade não se centra mesmo na União Europeia).

 

© Sociedade Portuguesa de Inovação, 1999
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