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AS EXPORTAÇÕES |
O modelo mais elementar, mas também mais evidente,
sobre os efeitos das exportações é o que se refere a um produto homogéneo
que um país consegue colocar no mercado mundial mediante um preço (único critério
de escolha racional em produtos homogéneos) mais baixo que aquele aí
prevalecente. Além disso, admite-se que o montante exportado pelo país é
muito pequeno face ao volume desse produto transaccionado no mercado mundial.
Esta hipótese permite assegurar que o preço mundial não sofre qualquer perturbação sensível pelo aparecimento desse
volume de exportações. |
FIG.
4.1
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Previamente à exportação, produziam-se no país qd unidades, todas
consumidas no mercado doméstico, vendendo-se ao preço pd. |
Excedente do consumidor é a diferença entre o preço máximo que o consumidor estava a dar por uma unidade de produto (o chamado preço de reserva, que subjaz ao desenho da curva de procura) e o preço que efectivamente paga por ele. |
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Ao contrário, o produtor sai manifestamente beneficiado, sendo o seu benefício adicional, relativamente à situação inicial, traduzido na figura 4.1 pela soma das áreas I, II, III e IV. A primeira é exactamente aquela que os consumidores perderam e que traduz uma transferência de benefícios interna dos consumidores para os produtores, uma vez que estes agora cobram mais pela mesma quantidade. As outras três decorrem dos ganhos com as exportações que neste caso atingem a quantidade qe – qr. A soma de II e III reflecte o ganho que o produtor tem pelo facto de ter exportado qd – qr a um preço unitário pi, em lugar de ter vendido essa quantidade no mercado doméstico ao preço pe. A zona IV descreve o ganho dos produtores por terem aumentado a sua produção de qd para qe e por terem vendido essa quantidade adicional ao preço pi que lhes proporcionou um excedente. |
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Excedente do produtor é a diferença entre o preço de venda do produto e o seu custo marginal implícito na curva de oferta. A soma dos excedentes dos consumidores e dos produtores é o chamado bem-estar social. |
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Contudo, para além da necessidade de verificar o que acontece às importações, que são a sua “leitura dual”, é bom não esquecer que, se o conjunto ganhou, nem todos ganharam e que, além disso, os resultados radicam em hipóteses que frequentemente não aderem à realidade. No que toca à repartição de ganhos, ela é desigual e até perversa. Não se trata só de os produtores se apropriarem de todo o excedente criado pelas exportações. Apropriaram-se também de excedentes que anteriormente eram dos consumidores, para além de lhes terem “racionado” as quantidades vendidas. Por isso, e com base nas hipótese deste modelo, exportar é bom para os produtores, mas é mau para os consumidores. Atendendo aos modelos desenvolvidos no Capítulo 3, facilmente se reconhece que as hipóteses que sustentam estas conclusões são muito restritivas. Sem querermos ser exaustivos quer quanto à indicação das diferenças face à realidade do comércio internacional, quer relativamente às consequências do alívio de algumas dessas restrições, não podemos deixar de considerar algumas situações que ficam como indicação para um maior aprofundamento da interpretação das exportações num contexto de maior realismo. |
1. Em primeiro lugar, o facto de as exportações serem pouco significativas em termos do mercado mundial. É certo que para boa parte das exportações portuguesas esta condição é razoavelmente satisfeita. Mas casos há, como os produtos de cortiça, em que não é legítimo admitir que o preço internacional não se “ajusta” ao volume das exportações, provocando uma alteração das condições da figura 4.1, já que a curva de oferta no mercado mundial vai modificar-se. Em particular, se houver aumentos de exportações, aumenta também a oferta no mercado mundial e baixa o preço de equilíbrio, diminuindo em termos relativos as áreas representadas nessa figura. Além disso, como o mercado internacional “sente” essa modificação, pode surgir nos nossos principais competidores uma reacção estratégica que, por exemplo, ainda faça maior pressão sobre os preços, reduzindo francamente as vantagens da exportação. 2. Em segundo lugar, a consideração de um produto homogéneo, sendo certo que as exportações se processam crescentemente num contexto de comércio intra-industrial. Perante a diferenciação do produto subjacente a este tipo de comércio, deixa de fazer pleno sentido a consideração de um único preço no mercado mundial, sendo necessário ter em conta as vantagens relativas dos “nossos” produtos face aos dos competidores, que se reflectem, de algum modo, nos termos de troca e não são adequadamente capturados pelos elementos presentes na figura 4.1. Em particular, se os “nossos” produtos forem muito “apetecidos” pelo mercado internacional nem sequer é condição de venda um preço inferior ao desse mercado. São, aliás, essas exportações que maior valor acrescentam à economia nacional, elevando os termos de troca. 3. Este tipo de trocas leva-nos a uma terceira diferença relevante: admite-se que a oferta dos produtores domésticos é sempre crescente, mas sabemos que a existência de economias de escala, em especial quando têm uma extensão significativa relativamente ao mercado interno, permite o abaixamento dos custos (e consequentemente dos preços) para produções de maior dimensão. Neste caso, as exportações não são vistas necessariamente como um prejuízo para os consumidores domésticos, antes lhes facultando, eventualmente, melhores condições de preço e até maior nível de satisfação.
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Finalmente, é óbvio que estes três tipos de alterações vão influenciar decisivamente a leitura de quem ganha (e quanto ganha) e de quem perde (e quanto perde) feita a propósito da figura 4.1. Efectivamente, o problema da repartição dos rendimentos decorrentes da actividade de exportação passa a ser bem mais difícil de aferir do que no modelo simples apresentado, sendo de referir que, mesmo aí, quando se diz que ganham os produtores e perdem os consumidores não estamos a fazer qualquer tipo de juízo sobre a “bondade” ou “maldade” desse efeitos. É que tal juízo não será possível sem conhecer quem são os consumidores, quem são os produtores e qual é o efeito dinâmico sobre a economia que esta alteração de repartição implica. |
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Sociedade Portuguesa de Inovação, 1999 Edição e Produção Editorial: Principia. Execução Técnica: Cast, Lda. |