1.3
C
onclusão

NECESSIDADE DE GESTÃO EFICIENTE DA INOVAÇÃO

Definimos uma nova perspectiva da inovação em que esta é movida pelos mercados e se torna uma necessidade fundamental da actividade diária da empresa, apesar de existirem custos e riscos que podem ser elevados. Estamos a perspectivar empresas que têm necessidade de inovar porque não há outra alternativa, porque não têm escolha. Algumas poderão estar receosas dos custos e riscos, sobretudo as mais pequenas que não podem desenvolver actividades em número suficiente para que os sucessos compensem os insucessos.
 

 

Ter receio dos custos e riscos da inovação é a melhor forma de iniciar uma actividade moderna, dinâmica e sustentada de inovação.

 

Em minha opinião, não há nada mais perigoso que uma visão simplista e bem-intencionada das virtualidades das novas tecnologias e dos novos métodos. De facto, podemos conceber grandes revoluções, mas a História também nos ensina que é frequente que quem lidera revoluções venha a morrer com elas.
Temos de definir pragmaticamente quais são os nossos objectivos. Não sugiro que se ponha de parte a inovação revolucionária - continuo a afirmar que existirá sempre e que muito lucrarão as empresas que tiverem a sorte de encontrar uma ou outra no seu percurso. No entanto, este livro fala de outra questão: a inovação global, integrada, disseminada no quotidiano da empresa, que lhe permite aumentar a flexibilidade e capacidade de resposta, melhorar a sua posição competitiva, adaptar-se às mutações dos mercados. Trata-se de uma actividade que tem de ser dinâmica e contínua, portanto, exequível e sustentável. Não estamos a falar de um investimento que se recupera no futuro, mas num elemento de trabalho quotidiano, tão incorporado nas empresas como os sistemas de qualidade ISO ou o Plano Oficial de Contabilidade, que faz parte da sua forma de operar e que se traduz na organização da empresa e do seu trabalho e nas formas de relacionamento com o exterior.
Consequentemente, temos de falar de uma gestão eficiente da inovação. Para isso, devemos definir o que queremos, para depois identificarmos o que precisamos para o obter.

 

  • Queremos ter ideias (muitas ideias)
    precisamos de estratégias e mecanismos variados de obtenção de ideias e metodologias propícias à sua gestação e desenvolvimento.

  • Queremos saber todas as formas de as concretizar
    precisamos de uma boa base de conhecimento (knowledge-base) sobre os produtos e processos, e de estar actualizados em inovações científico-tecnológicas utilizáveis.

  • Queremos minimizar os riscos de insucesso
    precisamos de metodologias de análise apropriadas e processos eficazes de identificação de potenciais problemas, sobretudo de implementação.

  • Queremos minimizar os custos
    precisamos de metodologias eficientes e de processos sistemáticos de gerir projectos de inovação, e de distinguir as "competências nucleares" que a empresa deve ter das "competências complementares" a identificar no exterior (parcerias, outsourcing)


FACTORES DE SUCESSO
 

Um projecto de inovação envolverá:

  • um conjunto de pessoas, provavelmente algumas da empresa e outras contratadas ao exterior e/ou de empresas parceiras no desenvolvimento (por exemplo fornecedores), que desenvolverão o projecto e encontrarão soluções;

  • um conjunto de pessoas da empresa, eventualmente diferente do anterior, que irá implementar o novo projecto e operar quotidianamente com ele, quando este se tornar uma realidade;

  • um outro conjunto de pessoas, desejavelmente muito alargado, que irá utilizar o resultado final (os clientes).

 

A principal chave do sucesso de qualquer metodologia de gestão de inovação é conseguir envolver eficazmente todos estes elementos; a maior razão de insucesso é ter esquecido algum.   

 


 

Por exemplo: subestimou-se uma praticabilidade da operação de uma máquina que afecta drasticamente a sua rentabilidade porque se esqueceu de verificar com os trabalhadores o seu modo de funcionamento; descobriu-se que materiais necessários à produção com os requisitos exigíveis não estavam disponíveis na quantidade ou preço esperado porque as especificações dadas no único contacto com fornecedores, no início do projecto, tinham sido muito vagas; não houve a percepção que, sem uma alteração adicional, a utilização do produto era difícil ou inconveniente porque nunca se pensou na perspectiva do utilizador.
Conforme referido amplamente em literatura, a maior probabilidade de insucesso de inovações em empresas ocorre quando se adquire uma solução/tecnologia desenvolvida algures por outrem e se tenta utilizá-la tal-qual na empresa. 

 


Factor número 1 para o sucesso em inovação: as soluções devem ser talhadas na empresa - envolver todos os níveis da estrutura interna relevantes e recorrer a fornecedores, consultores, especialistas, etc. conforme necessário. Não "importar" soluções feitas.

 



Um segundo factor essencial é a orientação dos trabalhos e das soluções para o cumprimento de expectativas. Logo à partida, este é um requisito importante na leitura dos mercados e das suas tendências (este assunto será mais explorado a propósito de reengenharia e de análise funcional -  QFD - ver ponto 3.7). O exemplo clássico é explícito: as pessoas não compram brocas de 5 mm porque querem brocas de 5 mm: compram-nas porque querem buracos de 5 mm. Continuando nesta linha de raciocínio para um caso específico, também não querem buracos de 5 mm, querem pôr um parafuso de 5 mm na parede, e também não é isto que de facto querem, mas sim, por exemplo, pôr um quadro na parede. Se as expectativas sobre as brocas de 5 mm se resumem a conseguir colocar quadros na parede, é nisto que temos de nos concentrar, não na produção de brocas.
O cumprimento de expectativas, que obviamente implica a sua compreensão por todos, é essencial para que o conjunto de pessoas envolvidas num projecto de inovação produza rápida e eficientemente os melhores resultados. Por exemplo, um consultor contratado para desenvolver um produto para uma empresa tem de saber qual é o objectivo verdadeiro da empresa: responder à concorrência? Aumentar os lucros no ano seguinte? Conquistar um novo segmento de mercado? Quais são as expectativas que deve cumprir? A sua acção e o resultado final que vai apresentar dependem certamente da resposta. Outro exemplo: um operador envolvido numa equipa de um projecto de inovação encontra muitos problemas na implementação de uma determinada máquina - o seu objectivo é que o resultado do projecto seja o mais eficiente possível? Ou a sua perspectiva é que, caso a máquina seja adquirida, o seu posto de trabalho possa ficar em perigo? O chefe da equipa de projecto terá de interpretar e lidar com o assunto de formas diferentes, consoante o caso. 
Ainda nesta lógica, coloca-se uma questão estratégica de fundo: se as expectativas da empresa são aumentar lucros cortando na qualidade do produto e se as dos clientes são maior qualidade nos produtos, deparamo-nos com uma incompatibilidade de expectativas que sugere insucesso; igualmente, se as expectativas da empresa são aumentar a qualidade do produto (conseguindo manter o preço) e as dos clientes são preço mais baixo, mesmo que com alguma perda de qualidade, também estamos numa via errada.

 

 

Factor número 2 para o sucesso em inovação: no desenvolvimento de acções de inovação, os objectivos e expectativas envolvidos em cada aspecto devem ser claros e partilhados por todos, dentro e fora da empresa (incluindo, obviamente em primeiro plano, os clientes)

 

 

Uma necessidade crescente, aliás também consequência de uma actividade de inovação bem gerida, é a capacidade de aprender com a inovação. Na teoria moderna da gestão de empresas, utiliza-se o termo "organização em aprendizagem" (learning organisation) para designar empresas que vão aprendendo em resultado da sua actividade, aumentando a sua base de conhecimento (knowledge base). Dessa forma, vão criando elementos diferenciadores e vantagens competitivas. Pela natureza da inovação, é evidente o benefício da aprendizagem progressiva não só sobre os produtos, processos e mercados, mas também sobre as próprias metodologias de gestão da inovação. Dessa aprendizagem resulta uma cultura própria, específica da empresa, que traduz no fundo a adaptação que esta vai fazendo da teoria da inovação no abstracto ao seu caso concreto, ao seu ambiente, às suas relações com o exterior e às suas competências nucleares.
 

Factor número 3 para o sucesso em inovação: desenvolver a capacidade de auto-aprendizagem da organização - absorver, reflectir e transformar a informação adquirida e as experiências, integrando-as na sua base de conhecimento e nas suas metodologias e formas de trabalho.


Podemos concluir, de acordo com a moderna teoria económica, que haverá cinco capacidades fundamentais para as empresas:

 

  1. Capacidades estratégicas - orientação da actividade, conhecimento da sua natureza e missão, adequação da forma de intervenção no mercado a estas realidades, perspectivas e objectivos da evolução da empresa, estratégias comerciais.

  1. Capacidades organizativas - organização da própria empresa, estruturas internas, relacionamento com o exterior, organização de equipas e de trabalhos de inovação, gestão de recursos humanos adequada à inovação.

  1. Capacidades técnicas ou funcionais - conhecimento de produtos e processos, tecnologias e know-how em geral.

  1. Capacidades de mercado - conhecimento dos segmentos trabalhados, características e perspectivas de evolução, identificação das expectativas e preferências dos clientes e sua evolução, posicionamento no mercado.

  1. Capacidades de aprendizagem - evolução da base de conhecimento, adaptação e melhoria de práticas.

(Nota: esta classificação resulta de uma adaptação de Hauknes, 1988, da teoria original de Carlsson e Eliasson, 1994, onde as competências de mercado não estavam individualizadas das estratégicas.)

© Sociedade Portuguesa de Inovação, 1999
Edição e Produção Editorial: Principia.    Execução Técnica: Cast, Lda.