3.5
PLANEAMENTO E GESTÃO DE PROJECTOS

"A mente humana, uma vez estendida por uma nova ideia, nunca retoma as suas dimensões originais."
Oliver W. Holmes


FASES DE TRABALHO


"A imaginação cresce com o seu exercício".
W. Somerset Maughan

As técnicas fundamentais de planeamento e gestão de projectos de inovação são semelhantes às de quaisquer outros projectos. Os objectivos de um projecto são alcançados cumprindo um determinado conjunto de tarefas (eventualmente divididas em subtarefas), que terão determinadas relações entre si (por exemplo, algumas tarefas só são realizáveis quando outras estiverem terminadas; algumas tarefas têm de ser desenvolvidas em paralelo). As tarefas serão desenvolvidas por diferentes pessoas que constituem a equipa de projecto.
Tendo em atenção a importância dos aspectos cognitivos na gestão da inovação, já referida anteriormente, valerá no entanto a pena analisar algumas regras fundamentais que importa considerar adequadamente em projectos de inovação. Em termos gerais, um projecto terá as seguintes fases:

  1.  Esboço do projecto.

  1. Selecção dos membros da equipa.

  1. Estabelecimento do plano.

  1. Definição de metodologia(s).

  1. Estabelecimento de critérios e pontos de monitorização (ocasiões de avaliação do projecto de acordo com os critérios estabelecidos).

  1. Execução das tarefas, gestão da comunicação, acompanhamento e monitorização.

  1. Avaliação final do impacto.



ESBOÇO DO PROJECTO
 

"As soluções de um problema são racionais, o processo de as encontrar não."
William Gordon

De acordo com os princípios inerentes à dimensão cognitiva dos projectos de inovação, é fundamental envolver todos os elementos da equipa na definição do projecto, tarefas, objectivos, metodologias, etc., de modo a compreenderem bem e aceitarem as metas definidas e a se empenharem no seu alcance. Este assunto será ainda mais explorado no ponto 3.6. Desta forma, o planeamento resultante das fases de análise de ideias não é para nós senão um esboço: só o designaremos de planeamento quando a equipa que vai executar a implementação da ideia (e o desenvolvimento prévio, se houver) tiver revisto o projecto e estiver pronta a arrancar.
Para este esboço, recomenda-se a utilização de aplicações informáticas que permitem visualizar a calendarização, as tarefas e suas interdependências e os recursos afectados. O exemplo mais típico é o  MicroSoft Project, que permite desenhar cartas de Gantt e de Pert com grande facilidade e analisar constrições e cenários variados. Assim, a equipa pode visualizar facilmente o impacto de diferentes cenários.


SELECÇÃO DA EQUIPA
 

"Na mente do principiante há muitas possibilidades, na do perito há poucas."
Shunryu Suzuki

Eventualmente, a selecção da equipa terá também sido feita no final das fases de análise das ideias. A selecção dos seus membros é uma tarefa crucial para o sucesso do projecto e deveria merecer bastante atenção. Há duas dimensões essenciais a considerar: competências técnicas e características pessoais. Já foi referido que um bom elemento de uma equipa não o pode ser no abstracto; um elemento é bom ou mau consoante a sua capacidade de se entrosar eficazmente com os outros - sem competências técnicas mínimas tal não acontecerá, mas é preciso mais do que isso. Este assunto será discutido em maior profundidade no ponto 3.6.
Outro aspecto fundamental a considerar é que nem todas as pessoas têm uma capacidade de prestação máxima: provavelmente, muitas terão enquadramentos diversos onde a falta de tempo ou de motivação acarretará a desadequação de um elemento potencialmente capaz. No caso de se entender que existe o risco de determinadas tarefas não terem recursos humanos disponíveis para a sua execução nos prazos e orçamentos previstos dever-se-á ponderar o interesse em subcontratar partes do trabalho, ou em envolver consultores externos. 
Para além destes aspectos, há ainda uma regra de base frequentemente referida: a equipa deve ser pequena para uma melhor gestão do trabalho (7 a 12 pessoas no máximo, consoante a dimensão do projecto). Os erros apontados como mais comuns na selecção de uma equipa de trabalho são:

  • incluir representantes de todos os departamentos da empresa em todas as fases do trabalho, resultando numa equipa excessivamente grande, onde durante muitas reuniões uma parte dos presentes sente estar a perder tempo;

  •  incluir elementos pelas suas competências profissionais ou posições hierárquicas, sem atenção às suas qualidades como "membro de equipa" (team player);

  •  escolher ou designar um chefe de equipa sem capacidade organizativa (incapaz de liderar ou liderando tão autoritariamente que a equipa fica reduzida decisionalmente a ele - os outros elementos não contribuem de facto);

  •  incluir membros que entendam ser sua função defender "interesses" da sua secção/divisão;

  •  incluir membros que estejam envolvidos em muitas outras tarefas, implicando constantes prioridades de trabalho conflituosas.

Nesta fase, a empresa tomará uma decisão sobre a participação de elementos externos (de outras empresas, parceiras no projecto, ou consultores). Em relação à utilização de consultores, é importante analisar as vantagens e desvantagens.
Os consultores externos podem ser úteis para:

  •  providenciar uma visão isenta, não afectada por "políticas" internas;

  •  trazer novas ideias do exterior, incluindo conhecimento de novas tecnologias e benchmarking;

  •  garantir disponibilidade suficiente: um consultor pode ser requerido para trabalhar a tempo inteiro, ou em boa parte do tempo, liberto dos problemas quotidianos que provavelmente inundarão muitos dos elementos da empresa com competência profissional comparável.

Recorrer a consultores tem no entanto perigos evidentes, sobretudo se detiverem funções de liderança do trabalho:

  •  enveredar por caminhos menos adequados à empresa por falta de conhecimento das realidades específicas ou sensibilidade a elas;

  •  conduzir a soluções vistas pelos quadros da empresa como "exteriores" e a um resultado que não é percepcionado como fruto das suas expectativas e interesses;

  •  incluir elementos na equipa demasiado "senhores das suas ideias" (as chamadas "prima-donas" ou "gurus"), que não admitem variações aos seus procedimentos estabelecidos, e que acabam por ser, de facto, uma barreira à inovação, no caso específico da empresa.

Consequentemente, há que definir com precisão o papel a desempenhar por consultores externos. Idealmente, a equipa deveria ser chefiada por um quadro da empresa, evitando que o trabalho seja visto internamente mais como da empresa de consultadoria do que da "nossa". Há três tipos de contribuições que podem ser dadas por consultores externos numa equipa liderada por um quadro da empresa:

  •  Catalisador. Pessoa cuja função é desenvolver as interfaces e auxiliar à aplicação de metodologias que garantam uma gestão eficiente do trabalho. Desejavelmente, deveria ser uma pessoa (ou mais, como é óbvio) experiente na aplicação dessas metodologias, que pudesse conduzir a sua aplicação, sobretudo na vertente cognitiva. Pode também ter a responsabilidade pela monitorização do projecto, dado ser provável que tenha uma visão mais objectiva da medição de indicadores, sobretudo os qualitativos, relacionados com aspectos intangíveis.

  •  Especialista. Pessoa com conhecimentos mais aprofundados do que os da empresa numa área técnica (os exemplos mais comuns são os especialistas de sistemas de informação ou de comunicação, incluindo publicidade). Neste caso, o consultor executará tarefas específicas e aconselhará a tomada de decisões sobre os assuntos da sua área de competência.

  •  Analista. Pessoa com visão abrangente do sector e conhecimento de empresas similares, no País e no estrangeiro, com capacidade de análise e de síntese, cuja principal função é organizar análises, avaliações e apresentações do trabalho (incluindo relatórios). Esta função tem particular interesse em actividades que envolvam várias opções. Pode também incluir a monitorização do projecto e avaliação final do impacto.

ESTABELECIMENTO DO PLANO
 

"Quando o caminho chegar ao fim, muda. Tendo mudado, seguirás em frente."
I Ching

O planeamento do projecto definido na fase de análise de ideias, que designámos anteriormente apenas por esboço, deve ser inteiramente revisto e aprofundado (se necessário) na primeira reunião da equipa de projecto. O chefe da equipa utiliza o esboço e todo o conhecimento da fase anterior desde a concepção da ideia para explanar os objectivos e criar um ponto de partida. No entanto, não se espera que daqui resulte uma grande alteração do plano - isso obrigaria a uma reavaliação e indicaria que alguma coisa tinha corrido mal nas fases de geração e análise de ideias. O objectivo é envolver todos os elementos da equipa nos objectivos do trabalho, fazendo com que este seja agora um trabalho de todos, em que todos se possam empenhar. No caso de a equipa corresponder sensivelmente àquela que trabalhou a ideia antes, esta fase pode ser apenas um ponto da situação. De qualquer modo, é uma altura óptima para garantir o interesse e motivação da administração da empresa. O planeamento é tanto um instrumento de monitorização e controlo do projecto como um elemento de comunicação da equipa com o exterior (sobretudo com a administração e com financiadores externos, se aplicável).
O planeamento deve começar por considerar:

  •  as questões empresariais que conduziram à necessidade deste projecto (qual é a causa?);

  •  os objectivos do projecto (o que é que vamos tentar alcançar?);

  •  os critérios de sucesso/insucesso (como vamos medir o cumprimento dos objectivos?);

  •  o âmbito do projecto (o que está envolvido e o que não está);

  •  a abordagem gizada (esboço do planeamento - as tarefas) e a calendarização prevista (quando temos de ter resultados prontos e quais?);

  •  o orçamento previsional (qual é o investimento que podemos fazer nas fases de desenvolvimento da ideia e implementação?);

  •  a equipa de projecto (quem está na equipa e porquê? O que se espera de cada elemento da equipa?);

  •  os patrocinadores do projecto (a quem responde a equipa? Administração, financiadores, etc.).

  • Seguidamente, analisam-se todos estes aspectos e prossegue-se na definição das diferentes tarefas (e subtarefas).

DEFINIÇÃO DE METODOLOGIAS
 

"Soluções perfeitas para as nossas dificuldades não se podem encontrar num mundo imperfeito."
Winston Churchill

Em primeiro lugar, é fundamental assentar com toda a equipa na metodologia de trabalho a seguir. Pode valer a pena explorar os aspectos cognitivos de trabalhos de equipa (ver ponto 3.6.), sobretudo se muitos dos elementos nunca se tiverem encontrado antes. É preciso discutir os aspectos ligado a comunicação (oral, escrita), gestão de conflitos e execução de diferentes tarefas organizativas e funções dentro da equipa.
Seguidamente, temos de considerar as metodologias para realização das diferentes tarefas.
Habitualmente, sugere-se que o projecto no seu todo seja dividido de início em 5 a 10 grandes tarefas (ou tarefas gerais), descrevendo em cada caso os factores necessários para a sua execução ("entradas"), os resultados a obter, as principais decisões que haverá a tomar, os prazos e os investimentos ou gastos especiais em cada tarefa.
De seguida, cada tarefa é escalpelizada em várias subtarefas, processo que poderá continuar em subníveis sequentes até que todo o projecto esteja decomposto em vários elementos simples, para os quais se sabe exactamente quem vai fazer o quê e quando. A visualização das interacções é muito importante: quem depende do trabalho de quem, quando, para o quê?

ESTABELECIMENTO DE CRITÉRIOS 
E PONTOS DE MONITORIZAÇÃO

 

"Mesmo que estiver na via certa, se não se mover vai acabar trucidado por um comboio."
William Rogers

Regra geral, qualquer alteração necessária a um projecto será tão mais cara de efectuar quanto mais tarde for descoberta e executada.  
Também já afirmámos que o custo de um projecto falhado resultará num prejuízo tanto maior quanto mais tarde for identificado esse falhanço. Acrescentando ainda que os custos da inovação devem ser minimizados e que o cumprimento de orçamentos e prazos é por isso muito importante,
afigura-se essencial que qualquer projecto tenha um bom sistema de monitorização, em que se analise o progresso do trabalho, cumprimento de prazos, orçamentos e objectivos.  
Tal como os prazos e orçamentos têm uma baliza bem definida, também os objectivos devem estar traduzidos em indicadores mensuráveis. 
Uma regra importante do bom funcionamento de um projecto é estabelecer os critérios de análise antes deste se iniciar. Quando instados a avaliar um projecto a meio do seu curso, temos tendência para acentuar o que foi feito e os resultados obtidos, mesmo que irrelevantes, e minimizar a importância do que devia ter sido conseguido e não o foi ainda. Isto acontece sobretudo se estivermos a comunicar com o exterior, porque achamos que não é só o projecto que está em causa, mas a nossa própria capacidade de trabalho. Podemos ser levados a defender o indefensável, porque pensamos estar a defender-nos a nós próprios e não a um projecto que corre mal. No início do projecto, existe uma visão mais desapaixonada; à medida que ele vai evoluindo, caso se afaste do planeado, afastar-se-á obviamente por uma boa razão - conhecedores dessa razão, tendemos a desculpar o deslize.
Efectivamente, em muitos projectos de inovação pode ser mais grave não cumprir objectivos intermédios do que prazos ou orçamentos, sobretudo porque o impacto do incumprimento destes últimos é avaliável muito mais rápida e objectivamente. Devemos definir objectivos intermédios a alcançar em determinadas etapas do trabalho (milestones), de modo a provocar uma avaliação regular da evolução do projecto. Seria indesejável que houvesse longos períodos sem um ponto de análise e ocasiões em que vários objectivos intermédios fossem alcançados ao mesmo tempo.
A monitorização regular de um projecto é também um instrumento importante de comunicação com o exterior, sobretudo com os seus patrocinadores (administração, financiadores) - é preciso não esquecer que quando o projecto estiver acabado iremos precisar da sua aprovação. Se houver desvios ou alterações no balanço entre expectativas dos patrocinadores e entregas da equipa, é importante dirimi-los logo que apareçam. 

EXECUÇÃO DAS TAREFAS
 


"Fazer duas coisas simultaneamente é fazer nenhuma."
Publilius Sirus

Evidentemente, há pouco a dizer de especial sobre este assunto em termos de aspectos específicos da gestão da inovação. No entanto, vale a pena reforçar a importância da avaliação do modo como o projecto vai evoluindo, antecipando problemas e identificando falhas tão cedo quanto possível. Alguns problemas são resolúveis se identificados atempadamente, sobretudo porque com tempo suficiente pode haver soluções mais simples e económicas. Isto é particularmente pertinente em tarefas mais inovadoras de uma fase de desenvolvimento de ideias.
Na execução de tarefas de implementação é também útil reforçar a importância do envolvimento dos quadros da empresa que trabalharão com a "novidade", seja ela um novo equipamento, um novo método de trabalho ou um novo produto. É importante que todo o conhecimento acumulado pela equipa durante o desenvolvimento do projecto de inovação seja disseminado pelos "utilizadores" da inovação. Igualmente, é fundamental que os "utilizadores" tenham oportunidade de participar no desenho das soluções de implementação, não só para se sentirem motivados, mas também para evitar que a equipa de projecto ignore pequenos pormenores práticos que por vezes têm um impacto significativo. É importante neste âmbito não subestimar as eventuais necessidades de formação, para assegurar que os "utilizadores" façam no futuro um pleno e correcto uso da "novidade".


AVALIAÇÃO FINAL DO IMPACTO
 

"Nós gostaríamos de acreditar que não estamos no negócio de sobreviver, mas de ser bons e não queremos admitir a nós próprios que somos bons para conseguirmos sobreviver."
Dorothy Rowe

Definimos a capacidade de aprendizagem como uma das capacidades estratégicas essenciais das empresas detentoras de uma "cultura de inovação" (ver ponto 1.3). Esta capacidade permite ir criando sistemas de inovação cada vez mais eficientes, à medida que os projectos de inovação vão beneficiando das competências nucleares que a empresa desenvolve na gestão da inovação (ver capítulo 2). Consequentemente, a avaliação do impacto dos projectos que vão sendo executados é uma tarefa essencial. Infelizmente, é frequente pensar-se que se trata de um exercício académico, para o qual não há tempo: o que interessa é ir em frente e fazer mais coisas. 
No entanto, o hábito de avaliar criticamente a evolução e impacto de um projecto, comparando objectivos iniciais com resultados finais e impactos previsionais com impactos reais, é a melhor forma de aprendizagem. Em muitos aspectos técnicos as empresas reconhecem que a experiência é mãe do sucesso - então, também na inovação o deverá ser. Uma empresa pode arrancar com uma estratégia moderna de inovação com ajuda externa e benchmarking, mas o exercício efectivamente falhará se precisar de continuar assim: se tudo tiver resultado bem, a empresa deverá desenvolver as suas próprias competências e metodologias, os seus canais de comunicação com o exterior e modo de os trabalhar, a sua própria organização interna, ou seja, gerar internamente a sua dinâmica de inovação. 
Avaliar objectivamente o impacto de um projecto requer indicadores objectivos, para fugir à "parcialidade da paternidade" - normalmente, quem fez tende a exaltar os benefícios, quem não fez tende a minimizá-los.
Podem ser escolhidos vários indicadores, como por exemplo os sugeridos por Bellon e Whittington (1996):

 

  •  vendas de novo produto/total de vendas;

  •  novos clientes, atraídos por novo produto/total de clientes;

  •  número de clientes antes e depois da inovação;

  •  valor (relativo) dos novos clientes;

  •  quota de mercado antes e depois da inovação;

  •  lucro bruto antes e depois da inovação;

  •  margem antes e depois da inovação;

  •  turnover conquistado a concorrentes;

  •  ganhos de turnover/custos da inovação;

  •  níveis de absentismo e ausência do trabalho (incluindo disputas laborais)

  •  valor acrescentado por empregado.

Nenhum indicador é perfeito, o que não é motivo para os ignorar. Em princípio, os melhores indicadores são os que incidem mais de perto sobre o tipo de inovação em causa e seus objectivos.

© Sociedade Portuguesa de Inovação, 1999
Edição e Produção Editorial: Principia.    Execução Técnica: Cast, Lda.